

Aperte os cintos e prepare-se para a ação! O governo dos Estados Unidos e as empresas de tecnologia estão se preparando para um confronto de grandes proporções, inspirado no Velho Oeste, porém com um contexto diferente do esperado.
Durante a audiência da semana passada, Sheryl Sandberg e Jack Dorsey foram questionados sobre questões como privacidade online, interferência eleitoral e preconceito político. Os membros do congresso não se contentaram com as desculpas dos líderes tecnológicos e expressaram a necessidade de regulações para evitar violações de dados e disseminação de desinformação no futuro, apontando que essa abordagem poderia prejudicar o setor tecnológico.
O Senador Mark Warner (D-VA) afirmou que a era do Oeste Selvagem nas redes sociais está se encerrando.
A analogia feita pelo Senador Warner pode ter sido exagerada, porém nos levou a refletir: até que ponto a indústria tecnológica se assemelha ao Oeste Selvagem? E, tendo em vista que já vivemos a experiência de controlar um ambiente sem precedentes e sem regras sob a supervisão federal, o que a conclusão do período do Oeste Selvagem americano pode nos ensinar sobre o futuro do Twitter, Facebook e Google?
O historiador Richard White, da Universidade de Stanford, é um dos fundadores do Centro de Stanford para o Oeste Americano e tem expertise em história do oeste americano e do capitalismo. Durante uma entrevista com Mashable, o Prof. White concordou com a analogia feita pelo senador Warner entre o “Velho Oeste” e as mudanças regulatórias enfrentadas pela indústria de tecnologia, embora ele acredite que a interpretação de Warner possa não ter sido exatamente como ele quis transmitir.
“De acordo com o Professor O White, o Ocidente pode ser visto como uma lição importante sobre a importância da regulação. Ele destaca a necessidade de monitorar de perto aqueles que estão por trás dessas regulamentações e quem elas beneficiam.”
Em vez de retratar o “Velho Oeste” à la Westworld, o professor White explicou que a verdadeira história da colonização do Oeste envolveu o domínio das inovadoras ferrovias, em vez de capturar bandidos. Assim, o controle do Oeste americano no século XIX foi mais sobre regular as empresas tecnológicas do que lidar com criminosos, e as lições desse período histórico podem ser aplicadas ao nosso contexto tecnológico e político atual.
Segura firme nos teus chapéus de vaqueiro.
O texto foi modificado para ser mais conciso e compreensível.
Recentemente, durante uma reunião em Capitol Hill, o Senador Warner sugeriu que regulamentações estavam se aproximando para o setor de tecnologia, ao compará-lo com o período do “Velho Oeste”. Considerando sua experiência como historiador do “Velho Oeste”, essa comparação lhe parece apropriada?
Prof. White: Pode ser uma metáfora apropriada, mas não pelos motivos que ele imagina.
Na maioria das vezes, quando menciono “Velho Oeste”, estou me referindo ao estilo de vida do oeste americano – a representação do xerife que chega à cidade para acabar com a violência. Não há problema se preferir fazer uma comparação com um filme.
Se você deseja fazer uma comparação com o Velho Oeste dos anos de 1800, é possível traçar um paralelo entre as empresas ferroviárias e as grandes empresas de internet – tanto aquelas que operam plataformas quanto aquelas que controlam o conteúdo. Naquela época, o Oeste era dominado por corporações que haviam recebido favores do governo federal, utilizando subsídios e tecnologias federais, além de se envolver em negociações corruptas para obter controle sobre a paisagem ocidental. Essa semelhança é o que considero mais próxima.
Então, a ideia de um Velho Oeste com xerifes e bandidos não corresponde à realidade? Qual é a origem dessa representação na nossa história?
O conceito do Oeste Selvagem foi popularizado por romances do final do século XIX e por filmes ocidentais do século XX. Essa imagem foi formada por representações cinematográficas e não reflete necessariamente a realidade histórica do Velho Oeste. Embora tenha havido violência na região, a maior parte dela foi direcionada aos povos indígenas e mexicanos, e não necessariamente refletia os típicos confrontos de duelos nas ruas principais.
Qual era a situação do Ocidente e quais semelhanças você percebe com a indústria de tecnologia?
Nos primórdios, os caminhos-de-ferro surgiram nas vastas planícies, montanhas rochosas e desertos sob a gestão de uma corporação subsidiada pelo governo federal. Sua existência se justificava pela necessidade do governo em estabelecer meios de transporte, configurando assim um sistema para a locomoção de pessoas, mercadorias e dados, de forma semelhante ao papel desempenhado atualmente pela internet.
As ferrovias no Ocidente tinham um controle significativo sem regulamentação, com grande movimentação de mercadorias e perdas financeiras consideráveis. Devido à falta de opções de transporte alternativas, essas corporações detinham um grande poder, semelhante ao que vemos atualmente com a internet. Mesmo que não seja do seu agrado, é a realidade em que vivemos.
Dessa forma, as companhias ferroviárias exerciam controle sobre o Oeste, ditando praticamente todas as regras. Quais foram as consequências disso para os habitantes da região?
Eles receberam uma grande quantidade de hostilidade do público.
As pessoas dependiam das estradas de ferro e não queriam que desaparecessem, mas viam as empresas como exploradoras, tirando lucros que deveriam ser das pequenas empresas. O objetivo inicial era facilitar o transporte, mas acabou se tornando um sistema de pedágio controlado pelas empresas ferroviárias, que eram subsidiadas e tinham influência no governo.
Dessa forma, surgiu um grande descontentamento em relação às ferrovias devido à sua influência tanto no comércio quanto no governo, o que resultou em um movimento de reforma nas décadas de 1880, 1890 e no início do século XX. Esse movimento tinha como objetivo colocar as ferrovias sob regulação e controle tanto federal quanto estadual.
Qual foi o impacto disso sobre a administração dos Estados Unidos naquela época?
Nas regiões pouco habitadas do Oeste, as empresas possuíam mais receita do que os próprios estados em que estavam localizadas, além de empregarem mais pessoas do que os governos estaduais. Apesar disso, as empresas ainda precisavam do apoio desses estados para serem reguladas de acordo com seus interesses. Por isso, passaram a influenciar as decisões políticas.
As ferrovias se integraram completamente ao cenário político. Um político que possivelmente poderia ter surgido para regular uma linha férrea, criticando-a, na verdade estava agindo a pedido de outra companhia ferroviária com a qual mantinha relações próximas. Com o tempo, as pessoas passaram a desconfiar, pois perceberam que alguns estavam agindo de forma interesseira. Isso se tornou uma questão de política interna, com favores sendo trocados e corrompendo todo o sistema político, levando as pessoas a perderem a confiança na política em si.
Por isso, a era dourada do século XIX pode ser comparada à atualidade devido à desilusão generalizada com a política, em que os políticos não se preocupam apenas consigo mesmos, mas também com os interesses corporativos que muitas vezes estão por trás dos interesses empresariais.
Qual foi o desfecho em relação às ferrovias e o que isso pode indicar sobre o futuro da regulação da internet?
A Comissão de Comércio Interestadual começou a intervir para definir tarifas ferroviárias, determinar práticas permitidas, estabelecer regulamentos gerais e assegurar igualdade de condições para todos os usuários das ferrovias. Embora tenham enfrentado desafios iniciais, as burocracias começaram a funcionar e, no início do século XX, a ICC estava operando efetivamente para controlar melhor essas estradas.
O regulamento recém-implementado está sendo eficaz? Será que a intervenção do governo federal para impedir que as empresas ferroviárias estabeleçam suas próprias regras foi mais equitativa para todos?
Os caminhos-de-ferro começaram a colaborar e aceitar regulamentações governamentais, pois perceberam a necessidade de um sistema coerente para a indústria, a fim de atender aos interesses dos grandes players do setor e evitar a nacionalização.
A situação pode ser problemática, pois criou-se um alto nível de exigência para ingressar nesse mercado. Geralmente, a regulamentação ocorre quando o setor já está consolidado e controlado por grandes empresas, as quais percebem as ameaças às suas operações. Pode ser que estejamos enfrentando essa realidade atualmente.
Quais são os obstáculos enfrentados durante a regulação das ferrovias que podem fornecer lições valiosas para a regulamentação das empresas de internet no início?
A principal armadilha é que as pessoas que controlam as empresas ferroviárias e as empresas de internet não são tolas. Eventualmente, eles vão aceitar a regulação e vão influenciar o governo para que a regulação beneficie mais a eles do que aos consumidores. A obtenção de regulação não garante os resultados desejados, e é importante que aqueles que estão pressionando por ela sejam vigilantes, pois as corporações não vão abrir mão do poder que possuem.
Assim, é importante agir com prudência em relação à generosidade dessas empresas à medida que seguimos em frente. A experiência nos mostra que estamos nos encaminhando para um processo de regulamentação. No entanto, o sucesso desse regulamento dependerá da vigilância dos consumidores em vez de permitir que as próprias empresas determinem as regras.
Sim, você não quer somente os políticos e as corporações na sala.
A internet e as ferrovias são desejadas pelas pessoas, mas o foco da regulação não é a tecnologia em si, e sim como essas tecnologias operam e funcionam, sendo esse o aspecto que as pessoas precisam controlar.
A evolução da tecnologia evidenciou que, muitas vezes, são as empresas que saem ganhando, enquanto a população americana e o governo acabam sendo prejudicados.
Indivíduos que têm acesso à tecnologia, independentemente da origem, a utilizarão em benefício próprio. Embora simples, essa afirmação é verídica.
É algo que temos negligenciado em nossa visão idealista sobre tecnologia, exceto recentemente.
Como historiador, sempre me surpreendi ao ver que aqueles que dominavam a internet e desenvolviam grandes empresas afirmavam ter como único objetivo servir ao bem público, apresentando visões utópicas. Contudo, as experiências dos últimos cinco ou seis anos revelam que essa não é a realidade.
Assuntos em destaque nas redes sociais como Facebook e Twitter incluem política.

Rachel Kraus é uma repórter de tecnologia da Mashable com foco em saúde e bem-estar. Ela nasceu em Los Angeles, é formada pela NYU e produz análises culturais online.